Dra. Andréa Ladislau / Psicanalista
Em meio às dores, indignação e revolta, a participante de um reality show, denunciou um estupro matrimonial, em meio a uma crise de pânico. A notícia movimentou as redes e trouxe à tona um tema que, infelizmente, é muito recorrente em nossa sociedade, apesar de ser pouco denunciado, até mesmo pela dificuldade das vítimas em enxergarem que foram violentadas, abusadas sexualmente pelo próprio companheiro.
Segundo a psicanalista Andrea Ladislau, o estupro no casamento, geralmente, ocorre seguido por ameaças, violência psicológica, violência patrimonial, para conseguir manter relações com a vítima. Relações sexuais não consensuais e, em muitos casos, associada à violência física
"Fato é que, amar alguém não requer incontável “perdoe-esqueça”, pois os danos emocionais causados, podem ser muito maiores que os danos físicos. Além disso, a base da relação está no respeito e no limite. Chocam os relatos que mostram que a mulher, apesar de dizer “não”, continua sendo desrespeitada, e sob protestos ou ameaças, cede contra sua vontade", explica.
Porém, Andrea lembra que muitas não conseguem enxergar a situação como sendo uma violência sexual. Tanto que, a ficha só caí quando resolvem tomar coragem de denunciar ou buscam um profissional de saúde para fazer terapia, dizendo-se abusadas, mas através de acolhimento e orientação, percebem que na realidade, sofreram um estupro.
"Ou seja, fica evidente a necessidade de abertura de mais instrumentos públicos ou privados que acolham e massifiquem as características dos tipos de violências. Abrindo também um canal de abordagem para que se sintam à vontade para expor suas dores", alerta.
Para a psicanalista se perceber vítima de um estupro sexual, praticado contra o próprio parceiro, seja marido, namorado ou ficante fixo é, no mínimo, triste e constrangedor. O que leva, grande parte delas, a esconderem a violência por vergonha ou medo, elevando o índice de subnotificação destes casos no país.
"!Psicologicamente falando, o que dificulta as denúncias é o vínculo que a vítima possui com o agressor. Esse elo faz com que ela se cegue e não perceba que está em uma situação de violência sexual ou psicológica. Se sentem culpadas muitas vezes e não entendem que, a partir do momento que, não se deseja o ato, verbalizou o NÃO, a violência se instaurou. Pois, ninguém é obrigado a nada", explica.
Estatísticas mostram a crescente dos relatos de estupros, de todas as naturezas. Seja dentro das casas das vítimas, ou mesmo nas ruas, em eventos, ou em locais de trabalho. O que demonstra demosntra segundo Andrea, a importância de políticas de proteção mais robustas, a padronização de regimes éticos e de seguranças internas eficazes dentro de todos os ambientes, no sentido de evitar os traços de crueldade, manipulação e perversidade que, certamente, provocam, nas vítimas, mudanças severas em sua percepção de valores e na forma como possam lidar com suas dores, possibilitando ainda o transporte do trauma para toda sua trajetória de vida e dificultando suas relações futuras.
"Enfim, o episódio do reality “Casamento às Cegas” demonstrou uma realidade que pode acontecer na intimidade de um casal. Dentro deste contexto, se faz urgente o fortalecimento dos cuidado, a orientação, o acolhimento e escuta ativa para as vítimas deste crime, muitas vezes silencioso, que anula o sorriso e rouba a vivacidade, ferindo e provocando sensação de culpa, inferioridade, fobias, além de dores físicas e na alma. Vivências traumáticas que podem ser irreparáveis. Já que, os reflexos do abuso sexual e do estupro, afetam diretamente o psicológico através dos traumas sofridos", finaliza.