O estudo mais detalhado da história sobre o efeito do clímax refuta mitos a respeito do orgasmo feminino - e explica como ele dá superpoderes contra a dor
Por Ana Carolina Leonardi(sirawit99/iStock)
Se até pouco tempo atrás a ciência ainda colocava em questão se o orgasmo feminino existia, você pode imaginar o quanto demorou para entendermos o que acontece no cérebro das mulheres durante o clímax.
Felizmente, está mais do que claro que elas têm orgasmos, sim. Já para entender a parte cerebral, foi necessária a ajuda de pesquisadores da Universidade Rutgers, nos Estados Unidos, e de 10 corajosas voluntárias. Corajosas porque o estudo exigiu que elas atingissem o orgasmo dentro de uma máquina de ressonância magnética.
Muita gente já sente pânico dessas máquinas claustrofóbicas, geladas e barulhentas. Por outro lado, várias mulheres não chegam ao orgasmo hora nenhuma, nem no conforto da própria cama. A combinação dos dois tinha tudo para dar errado – além de tudo, a ressonância só consegue imagens úteis se a pessoa conseguir manter a cabeça imóvel.
Surpreendentemente, com a ajuda de um estabilizador de cabeça e perseverança das participantes (uma delas, 74 anos, teve dois orgasmos dentro da máquina), foi possível fazer o estudo, em duas fases: a primeira com as próprias voluntárias se masturbando e a segunda enquanto elas eram estimuladas por parceiros.
Mito de “desligar” a cabeça
A primeira descoberta do estudo desmente a história de que a mulher tem que se desligar de tudo ao redor para conseguir chegar ao orgasmo. Esse mito chegou a ser validado por certos cientistas, que afirmavam que durante o sexo a mulher só atinge o clímax quando se concentra apenas nas sensações físicas, reduzindo a atividade cerebral em áreas associadas a outras coisas – incluindo a região que processa emoção.
O que as ressonâncias mostraram é o contrário. As imagens apontam que as áreas cerebrais responsáveis pelos sentidos, movimentos, memórias e emoções estão todas relacionadas ao orgasmo. A ação do cérebro ali vai aumentando gradativamente até o clímax (do sexo e da atividade cerebral) e então volta a baixar.
Imunidade à dor
Desde 1985 sabemos que, da estimulação até o orgasmo, as mulheres vão se tornando progressivamente mais tolerantes à dor. O estudo que confirmou isso, aliás, incluía apertar um dedo delas cada vez mais forte, antes e durante a estimulação, para ver o quão rápido elas reclamavam. Bizarrices à parte, durante o orgasmo a tolerância à dor chegou a ficar 75% maior. Mas ninguém sabia exatamente como isso acontecia.
Na nova pesquisa, foi possível observar exatamente como esse processo se dá no cérebro. Assim que chega o clímax, uma área chamada “núcleo dorsal da rafe” fica mais ativa. Ela auxilia no controle de liberação da serotonina, que, além de ser um dos neurotransmissores do prazer, pode ter o efeito analgésico. Outra área que tem um pico de atividade é o núcleo cuneiforme. O curioso é que essa parte do cérebro faz parte de um sistema que permite que a gente “administre” a dor mentalmente. É essa capacidade que nos dá a liberdade de passar, racionalmente, por atividades doloridas, mas necessárias – como vacinas e exames de sangue – ou até meio prazerosas, como tatuagens.
Esse combo de atividade cerebral ajuda a explicar porque o estímulo sexual aumenta a tolerância à dor. Sabendo disso, fica até mais fácil entender porque tem gente com fetiche por certas práticas dolorosas. Agora, ainda falta entender se esse mesmo efeito pode ser observado após o orgasmo masculino – e o motivo que levou nosso organismo a evoluir para unir prazer e dor dessa forma.