No momento contemporâneo, a implementação das audiências de custódia trouxe a relevo o artigo quinto inciso LXI da Constituição da República, onde diz que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”.
O princípio constitucional confrontado com a realidade prática convoca para uma reflexão a respeito dos procedimentos que ocorrem hoje, após o advento da audiência de custódia.
Praticamente a função do delegado de polícia foi extinta ou relegada a um plano burocrático. O que precisa ser revisto pela sociedade e pelos operadores do direito para recolocar este profissional ao patamar que lhe convém, da inteligência e do tirocínio no enfrentamento do crime e da apresentação à sociedade de resultados inibidores da criminalidade.
Não me refiro em hipótese alguma ao show radiofônico e televisivo sem propósito, vazio, e abusivo como se tem visto, excessivamente, mormente nos programas de rádio e TV sangrentos e escandalosos da criminalidade.
Muitos que como eu já tiveram oportunidade de atuar em processos judiciais onde, com a utilização de técnicas científicas, viram ser identificado um praticante de ato considerado crime pela lei penal com a coleta de digitais ou a realização de exame de DNA, quase como nos filmes CSI - Investigação Criminal, e afirmo já ter visto isso em processos correntes na comarca de Belo Horizonte, sabem que a função do delegado de polícia na investigação e na preparação do processo é fundamental para a acusação e para a defesa.
Mas cada vez mais essa atuação do delegado vem sendo transformada em mero “ctrl c” e “crtl v”, praticamente sendo copiados no relatório final do inquérito policial o texto do flagrante delito, ou da comunicação de serviço do agente de polícia.
Recentemente, atuando num procedimento na RMBH, pude observar que um delegado, após analisar as circunstâncias de um fato, ele e sua equipe estiveram no local no dia do acontecimento, entendeu que não existia crime e optou por não instaurar o inquérito policial.
Posteriormente, o promotor de Justiça e o juiz determinaram a instauração do inquérito policial e, não satisfeitos, insistiram ainda na realização de diligências específicas, até que acataram a primeira opinião do delegado de polícia e entenderam pelo arquivamento do caso.
É evidente que todos estamos sujeitos a erros no trato do dia-a-dia e no exercício de qualquer trabalho, mas é preciso valorizar o trabalho do delegado de polícia. Inclusive ampliando as suas possibilidades relativamente à concessão de liberdade provisória com ou sem fiança, que hoje tem uma disciplina muito restritiva na legislação para ser feita no ambiente da delegacia.
É hora de prestar mais atenção ao povo e, como na música, “ir aonde o povo está”, e no sistema de segurança pública o órgão público mais próximo do povo é a delegacia de polícia.
(*) Advogado e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB