quarta-feira, 14 de março de 2018

DE QUEM É ESSA TERRA?

Uma análise histórico-constitucional da propriedade dos terrenos marginais (margens de rios)


DIREITO ADMINISTRATIVO
BENS PÚBLICOS


O artigo faz uma análise histórico-constitucional da propriedade das terras marginais dos Estados-membros e da União frente a todas as normas incidentes na matéria, inclusive nas Constituições anteriores.

INTRODUÇÃO

Normalmente, sem grandes discussões, a União exige para si a propriedade das margens dos mares, rios e lagos, cobrando vultosas indenizações por sua ocupação de particulares, Estados-Membros e Municípios, quando, em verdade, na maior parte dos casos, caberia à União indenizar tais pessoas por ocupar áreas que nitidamente não são de sua propriedade.

O entendimento aqui demonstrado revela uma sistemática cobrança indevida por parte da União, que vem penalizando Estados, Cidadãos e Municípios desde o século retrasado. E, o que talvez seja mais grave, em patente afronta ao devido processo legal e aos direitos fundamentais.


Em suma, trata-se de expropriação abusiva e injustificável de terras alheias, bem como a exigência de indenizações que não lhe são devidas, nem tem legitimidade a União para exigir. Enquanto, noutro sentido, a União, sem qualquer tipo de indenização, goza de bens que não são de sua propriedade, sem nunca pagar seus verdadeiros proprietários.
DELIMITAÇÃO E EXPLICAÇÃO DO TEMA

Desde o século passado, há uma perene preocupação do Constituinte e do Legislador em definir claramente quais áreas pertencem à União, aos Estados Membros, aos Municípios e aos Territórios. Quando a cadeia dominial é estabelecida normalmente, por meio de relações de compra e venda, não existem grandes discussões. No entanto, quando tais entes adquirem a propriedade por meio de expropriação ou aquisição legal, algumas confusões são estabelecidas.

No presente artigo, visa-se esclarecer definitivamente as dúvidas por uma espécie de terreno específica, a saber, os terrenos marginais. Isto é, aquelas terras que se encontram às margens dos fluxos de água, diferindo-se dos Terrenos de Marinha por não submeterem-se à influência das marés.


Por mais improvável que pareça, atualmente, mesmo após de 6 (seis) Constituições Republicanas e pelo menos duas normas gerais, a questão ainda tem uma nebulosa interpretação. 

No intento de se estabelecer quais objetos jurídicos serão estudados, imperioso apresentar uma definição jurídica de cada um destes. A princípios, não existe grande necessidade de verificação de suas especificidades legais, mas tão somente uma conceituação genérica.

Legalmente, são denominados Terras ou Terrenos de Marinha aquelas áreas que se encontram às margens dos cursos d’água que sofrem influência das marés. São chamados de Terras ou Terrenos Marginais as margens de cursos de água que não se submetem à mare e suas mudanças.

Grosseira e suficientemente, pode-se considerar Terras de Marinha como a margem dos mares eTerrenos Marginais como a margem dos demais cursos d’água.

Especificidades à parte, então qual o imbróglio jurídico acerca desses institutos? Em primeiro lugar, tem-se que, ao contrário do que muitas vezes se apregoa, tratam-se de espécies distintas de bens, razão pela qual uma vez que a Constituição de 1988, expropriou tão somente[1] os Terrenos de Marinha, não há de se falar em propriedade automática da União sobre as margens dos rios e lagos.
DESANCAMENTO DO TEMA

A totalidade das questões possíveis de serem enfrentadas no presente estudo, perpassa, necessariamente, pela propriedade ou não da União acerca dos Territórios Marginais, razão pela qual se faz necessário descobrir, primeiramente, se é desta pessoa jurídica a propriedade dos bens ou de outrem.

A primeira norma a ser verificada é a exposta na atual Constituição da República, acerca dos bens da União. Observe-se assim os dispositivos capazes de solucionar a questão, especificamente, o art. 20, incisos I e VII da Constituição:

Art. 20. São bens da União:

I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;

(...)

VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;

Então, acerca das Terras Marginais, importa verificar que os bens da União seriam aqueles que eram de sua propriedade quando da promulgação da Constituição e as Terras de Marinha.

Em primeiro lugar, deverá então ser analisado, a qual património pertenciam, no momento em que foi promulgada a atual Constituição da República, os Terrenos Marginais, vez que, em relação aos Terrenos de Marinha, há óbvia expropriação de tais áreas em favor da União, por força do art. 20, VII da Constituição da República. Não obstante, tal posicionamento não é feito em relação aos Terrenos Marginais, isto é, as margens dos rios e cursos navegáveis.